Obrigatoriedade de se observar o princípio da anterioridade na fixação da remuneração dos agentes políticos municipais: análise do enunciado de ...
←
→
Transcripción del contenido de la página
Si su navegador no muestra la página correctamente, lea el contenido de la página a continuación
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Obrigatoriedade de se observar o princípio da anterioridade na fixação da remuneração dos agentes políticos municipais: análise do enunciado de Súmula n. 72 do TCEMG Caroline Lima Paz Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Pós-graduada no Curso de Especialização em Ciências Penais pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Técnica de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Luisa Pinho Ribeiro Kaukal Bacharel em Direito pela Universidade FUMEC. Pós-graduanda em Controle Externo da Gestão Pública Contemporânea pela PUC Minas em parceria com a Escola de Contas e Capacitação Professor Pedro Aleixo. Técnica de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Paula Cristina Romano de Oliveira Bacharel em Direito pela Universidade FUMEC. Pós-graduanda em Controle Externo da Gestão Pública Contemporânea pela PUC Minas em parceria com a Escola de Contas e Capacitação Professor Pedro Aleixo. Oficial de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Resumo: O presente estudo tem o propósito de examinar questão afeta à observância do princípio da anterioridade na fixação da remuneração dos agentes políticos municipais. O objetivo é analisar a posição da doutrina e da jurisprudência acerca do tema proposto diante das alterações ocorridas na Constituição da República, em especial com as Emendas Constitucionais n. 19/98 e n. 25/2000. Verifica-se, neste trabalho, que a observância ao princípio da anterioridade na fixação da remuneração dos agentes políticos municipais mostra-se pertinente diante de uma interpretação sistemática do texto constitucional, principalmente quando se leva em consideração os princípios basilares da Administração Pública, em especial o da moralidade administrativa. Palavras-chave: Remuneração dos agentes políticos. Subsídios. Princípio da anterioridade. Eleições. Moralidade administrativa. 77
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Abstract: The present study intends to analyze the issue related to the conformity to the principle of anteriority in determining the municipal political agents payment. The aim is to analyze the standing opinion of the jurists and the precedents in relation to the proposed issue after the Brazil Constitution amendments, especially the Constitutional Amendments n. 19/98 and n. 25/2000. It is verified, after the present research, that in conformity to the principle of anteriority the determination of the municipal political agents payment is applicable, by means of a systematic interpretation of the Constitution, especially when the Public Administration founding principles are taken into consideration, especially the administrative morality. Keywords: Compensation of the political agents. Legislators payment. Principle of anteriority. Elections. Administrative morality. 1 Introdução A questão atinente à obrigatoriedade de se observar o princípio da anterioridade para a fixação da remuneração dos agentes políticos municipais merece um estudo detalhado ante as modificações trazidas pelas Emendas n. 19/1998 e 25/2000 aos incisos V e VI do artigo 29 da Constituição da República. Em razão de tais emendas, passou-se a discutir tanto no âmbito doutrinário, quanto no jurisprudencial, qual a forma correta de se interpretar os referidos incisos no texto constitucional, levando-se em conta os princípios basilares da Administração Pública, em especial, os princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade. Assim, o presente artigo se propõe a realizar um estudo comparativo entre os posicionamentos doutrinários existentes sobre a matéria e a analisar as decisões do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, sob a ótica do enunciado de Súmula n. 72, e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, com o propósito de demonstrar o entendimento majoritário na atualidade e de nortear os trabalhos das Prefeituras e Câmaras Municipais no Estado de Minas Gerais. 2 Considerações iniciais sobre o enunciado de Súmula n. 72 do TCEMG O enunciado de Súmula n. 72 do TCEMG foi aprovado, por unanimidade, na Sessão Plenária de 28/11/1989, com a seguinte redação: Em face do disposto no inciso V do art. 29 da Constituição Federal de 1988, o legislador municipal não pode legislar em causa própria, razão pela qual a remuneração dos agentes políticos municipais deve ser fixada em cada legislatura para vigorar na subsequente. Posteriormente, na Sessão Plenária de 19/11/2008, os Conselheiros unanimemente deliberaram pela alteração do texto do enunciado, nos termos atualmente vigentes: “A remuneração dos agentes políticos municipais deve ser fixada em cada legislatura para vigorar na subsequente.” 78
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Fazendo um paralelo entre as duas redações acima transcritas, observa-se que, em ambas, a remuneração dos agentes políticos municipais está condicionada ao princípio da anterioridade, isto é, deverá ser fixada na legislatura anterior para produzir efeitos na subsequente. No entanto, verifica-se que a redação original do enunciado faz referência expressa ao art. 29, V, da CR/88. À época da aprovação do verbete, em 28/11/1989, o referido dispositivo constitucional previa a aplicação do princípio da anterioridade na fixação da remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores: Art. 29. caput [...] V — remuneração do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Vereadores fixada pela Câmara Municipal em cada legislatura, para a subsequente, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 150, II, 153, III, e 153, § 2°, I; (grifo nosso). Com o advento da Emenda Constitucional n. 19/1998, a Constituição da República passou a disciplinar a remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais no art. 29, V, e a remuneração de Vereadores no art. 29, VI. O princípio da anterioridade não se encontra previsto em nenhum dos dois incisos: Art. 29. caput [...] V — subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4°, 150, II, 153, III, e 153, § 2°, I; (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998) VI — subsídio dos Vereadores fixado por lei de iniciativa da Câmara Municipal, na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Estaduais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4°, 57, § 7°, 150, II, 153, III, e 153, § 2°, I; (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998). Posteriormente, com o advento da Emenda Constitucional n. 25/2000, o art. 29, VI, da CR/88 foi objeto de alteração, tendo sido inserida no seu texto a aplicação explícita do princípio da anterioridade na fixação da remuneração de Vereadores: Art. 29. caput [...] VI — o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subsequente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos: (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 25, de 2000) (grifo nosso). No âmbito do Estado de Minas Gerais, o art. 179, caput, da Constituição Estadual de 1989 dispõe sobre a aplicação do princípio da anterioridade na fixação da remuneração de Prefeitos, Vice- Prefeitos e Vereadores: “Art. 179. A remuneração do Prefeito, do Vice-Prefeito e do Vereador será fixada, em cada legislatura, para a subsequente, pela Câmara Municipal.” 79
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Acrescenta-se que a redação do art. 179, caput, da CE/1989 não foi modificada desde a promulgação do texto constitucional, em 21 de setembro de 1989, e guarda sintonia com a redação do art. 29, V, da CR/88, anterior à Emenda Constitucional n. 19/1998. Diante do quadro acima narrado, restará comprovado, neste estudo, que, a despeito da omissão do art. 29, V, da CR/88 (com redação dada pela EC n. 19/1998) quanto à aplicação do princípio da anterioridade na fixação da remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais, as decisões do TCEMG continuaram a reconhecer a incidência do mencionado princípio não apenas sobre a fixação da remuneração de vereadores, mas também sobre a dos demais agentes políticos municipais. Nesse sentido, destaca-se que a modificação sofrida pelo texto do enunciado de Súmula n. 72 na Sessão Plenária de 19/11/2008, portanto, em data posterior às Emendas Constitucionais n. 19/1998 e 25/2000, não incidiu sobre a aplicação do princípio da anterioridade na fixação da remuneração dos agentes políticos municipais, atendo-se a suprimir a alusão ao art. 29, V, da CR/88. Será também demonstrado que as decisões do TCEMG são no sentido de que o princípio da anterioridade encontra-se condicionado a um marco temporal correspondente à data das eleições municipais. 3 Aspectos atinentes ao conteúdo do enunciado de Súmula n. 72 do TCEMG Antes de se adentrar na questão relativa à incidência do princípio da anterioridade na fixação da remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos, Secretários Municipais e Vereadores, serão abordados alguns aspectos contidos no conteúdo do enunciado de Súmula n. 72, pertinentes à conceituação da expressão agentes políticos municipais e ao regime remuneratório ao qual estão submetidos. 3.1 Conceituação de agentes políticos municipais Primeiramente, insta ressaltar que a noção conceitual de agente político não é pacífica na doutrina administrativista. Bandeira de Mello (2008) e Carvalho Filho (2007) seguem uma linha mais restrita na conceituação da expressão, manifestando-se no sentido de que ela abrange apenas os chefes do Poder Executivo (Presidente, Governadores, Prefeitos e os vices respectivos), seus auxiliares imediatos (Ministros de Estado, Secretários Estaduais e Secretários Municipais) e os membros do Poder Legislativo (Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores). Para maior clareza, seguem transcritas as lições Bandeira de Mello (2008, p. 245-246) sobre os agentes políticos: [...] são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema 80
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes do Executivo, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados federais e estaduais e os Vereadores. O vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política. Exercem um munus público. Vale dizer, o que os qualifica para o exercício das correspondentes funções não é a habilitação profissional, a aptidão técnica, mas a qualidade de cidadãos, membros da civitas e, por isto, candidatos possíveis à condução dos destinos da sociedade. A relação jurídica que os vincula ao Estado é de natureza institucional, estatutária. Seus direitos e deveres não advêm de contrato travado com o Poder Público, mas descendem diretamente da Constituição e das leis. Donde, são por elas modificáveis, sem que caiba procedente oposição às alterações supervenientes, sub color de que vigoravam condições diversas ao tempo das respectivas investiduras (grifo nosso). Contrariamente ao posicionamento dos autores acima citados, Meirelles (2006) e Oliveira (2004) conferem maior amplitude à categoria dos agentes políticos, ensinando que estão inseridos nessa qualificação os membros do Ministério Público, dos Tribunais de Contas, do Poder Judiciário e os representantes diplomáticos: Os agentes políticos ocupam cargos eletivos ou vitalícios. São os integrantes dos três Poderes do Estado e, por equiparação, os integrantes do Ministério Público. Os que compõem o Executivo e Legislativo ocupam cargos eletivos. É o Presidente da República (e seus homólogos nos Estados e Municípios), os Ministros de Estado, bem como os que a eles são equiparados, e também os diplomatas e os Secretários estaduais, distritais e municipais. No Legislativo, os Senadores e Deputados Federais, bem como os correspondentes a estes nos Estados e Municípios. São agentes políticos porque detêm e são titulares do Poder do Estado, isto é, possuem a possibilidade jurídica de ingressar na esfera jurídica de outros, impondo-lhes deveres ou criando direitos. São não só os Chefes do Executivo, mas todos aqueles a quem é dada parte do exercício do Poder, isto é, os Ministros, Secretários Executivos e os diplomatas. Esses, representam o Estado federal no exterior. Os demais servidores das embaixadas e dos consulados são servidores públicos estatutários. Os Magistrados, membros do Ministério Público e os integrantes dos Tribunais de Contas, igualmente são agentes políticos, ocupando cargos vitalícios, ou seja, são indemissíveis, salvo mediante sentença judicial (OLIVEIRA, 2004, p. 10-11) (grifo nosso). Importa salientar que, como o presente estudo restringe-se à análise do enunciado de Súmula n. 72 do TCEMG, serão adotados os ensinamentos da primeira corrente, a qual defende uma noção conceitual mais restrita de agentes políticos. Nessa linha, a Corte de Contas Mineira, na Consulta n. 811.245 (Conselheira Relatora Adriene Andrade, sessão de 24/02/2010), posicionou-se, unanimemente, pela impossibilidade de se 81
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII considerar como agentes políticos municipais Chefe de Gabinete, Procurador de Município e Controlador de Município, aduzindo que se enquadram naquela categoria de agentes públicos apenas Prefeitos, Secretários Municipais e Vereadores. Segue transcrito excerto do voto proferido pela Conselheira Relatora: [...] Filiamo-nos a essa última corrente, considerando como agentes políticos apenas os que desempenham atividade típica de governo, cumprindo as funções de executores das diretrizes traçadas pelo Estado. Os agentes políticos exercem, pois, as atividades fixadoras de metas, diretrizes e planos governamentais essenciais para a consecução dos objetivos públicos, sendo eles os chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e municipal, os ministros e secretários de Estado, os senadores, deputados e vereadores. No âmbito municipal, são agentes políticos o prefeito, os vereadores e os secretários municipais. Os chefes de gabinete, procuradores e controladores do município não são agentes políticos, uma vez que não exercem função de Estado e não representam a vontade superior do Estado, não participando, portanto, das decisões políticas do governo, sendo escolhidos por sua aptidão técnica profissional. Em relação à definição de agentes políticos na órbita municipal, mostra-se relevante a explicação de Braz (2000, p. 32): O Governo do Município é exercido por agentes políticos (Prefeito, Secretários e Vereadores), auxiliados pelos servidores públicos efetivos e comissionados. O Prefeito e os Vereadores ocupam cargos eletivos e os Secretários cargos de confiança, de recrutamento amplo. A eleição do Prefeito importa a do Vice- Prefeito com ele registrado (art. 29, II, e art. 77, § 1°, da CF). [...] Para o exercício dos cargos eletivos de Prefeito e Vice-Prefeito Municipal, a Constituição, além da nacionalidade brasileira, do gozo dos direitos políticos, do alistamento eleitoral e da filiação partidária, exige a idade mínima de 21 anos. Os mandatos do Prefeito e do Vice-Prefeito correspondem a uma legislatura, que, pela legislação pátria em vigor, corresponde a quatro anos. O Secretário é a pessoa de confiança do Prefeito, que ocupa função de coadjuvante, de auxiliar direto. O Secretário, como agente político, não tem vínculo empregatício com o Município, podendo ser nomeado e exonerado a qualquer tempo pelo Prefeito Municipal. O cargo de Secretário é criado por lei, que deve dispor sobre a denominação, estrutura e atribuições. O número de Secretários varia de Município para Município e estes devem ser escolhidos entre brasileiros maiores de 21 anos, que estejam no gozo dos direitos políticos. O Vereador é o membro do Poder Legislativo Municipal, o agente legislativo municipal. Pessoa que vereia, isto é, vigia, rege e administra. [...] O número de Vereadores de cada Câmara Municipal é precisado pela Lei Orgânica do Município, obedecidos os limites definidos no art. 29, IV da Constituição Federal. A idade mínima para o exercício do cargo de Vereador é de 18 anos. O mandato dos vereadores é correspondente a uma legislatura. 82
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII 3.2 Regime remuneratório dos agentes políticos municipais Inicialmente, ressalta-se que na vigência da Constituição da República de 1946, da Constituição da República de 1967 e da Emenda Constitucional n. 1 de 1969, a remuneração dos agentes políticos era denominada de subsídio e se dividia em parte fixa e em parte variável. Com o advento da Constituição da República de 1988, o termo subsídio foi abandonado. Contudo, a remuneração dos agentes políticos continuou a compreender uma parcela principal, fixa — correspondente ao vencimento-base — e uma variável, composta por vantagens pecuniárias. A propósito, Bruno e Del Olmo (2006, p. 149-151) contextualizam o instituto do subsídio nas Constituições pátrias: O subsídio estava previsto como paga pecuniária aos Deputados Federais e Senadores, ao Presidente e ao Vice-Presidente da República, no art. 66, IX e art. 47 da Constituição Federal de 1946. Além dos subsídios, os Deputados Federais e Senadores tinham direito a uma ajuda de custo (art. 47). Para os Governadores dos Estados e para os Deputados estaduais, a mesma Constituição mencionava o termo remuneração, no art. 11, com redação dada pelo Ato Institucional n. 2/65. A Constituição de 1967 também mencionava o termo subsídio para os membros do Congresso Nacional (art. 35) e o dividia em duas partes, uma fixa e outra variável, sem prejuízo da ajuda de custo. Para os legisladores estaduais, continuava o subsídio no art. 13 e no art. 1° do Ato Institucional n. 7/69. A Emenda Constitucional n. 1, de 1969, que trouxe nova redação à Constituição da República de 1967, trouxe ainda o termo subsídio aplicável aos membros do Congresso Nacional (art. 133 e art. 44, VII) e aos membros dos Legislativos Estaduais (art. 13, VII). A Constituição da República de 1988 acabou com a expressão subsídio enquanto sinônimo de paga pecuniária destinada aos agentes políticos pelo exercício de seu mandato, conservando tal expressão apenas com o sentido de incentivo fiscal, como nos arts. 72, 150, § 6°, 165, § 6°, 177, § 4°, II, a e art. 227, VI. Com o surgimento da EC n. 19, de 4 de junho de 1998, o vocábulo subsídio volta a ser utilizado na qualificação da remuneração dos agentes políticos, entretanto não no sentido empregado pelos textos constitucionais anteriores (CR/1946, CR/1967 e EC n. 1/1969), mas sim para designar uma importância paga em parcela única, sobre a qual não poderá ser acrescida qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, nos termos do § 4° incluído ao art. 39 da CR/88: § 4° O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente, por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. Nesse sentido, Bruno e Del Olmo (2006, p. 149-151) ensinam: 83
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Foi a EC n. 19/98 que ressuscitou o termo subsídio, agora com um sentido novo, sendo paga em parcela única — e não mais dividida em parte fixa e variável — aplicável a algumas categorias de agentes públicos expressamente referidas na emenda. [...] Além da EC n. 19/98, mencionam o termo subsídio as Emendas Constitucionais n. 25, 32, 41, 45 e 47 e, não obstante todas estas citações, é no § 4° do art. 39 que o instituto recebe um delineamento próprio: [...]. A alteração trazida pela EC n. 19/1998 possui nítido propósito moralizador, pois, ao impedir a profusão de parcelas com natureza salarial, tornou mais transparente a remuneração percebida pelos agentes políticos e propiciou maior controle sobre dita remuneração, seja por parte do cidadão, seja por parte dos órgãos de fiscalização. Justen Filho (2005) explica que o regime de subsídio foi adotado com a intenção de assegurar o controle sobre a remuneração dos ocupantes de cargos e funções de mais elevada hierarquia, tendo em vista que, até então, era usual a fixação de vencimento-base com pequeno valor, agregando-se a ele, contudo, vantagens pecuniárias de grande relevo. Portanto, após a edição da EC n. 19/1998, passaram a coexistir dois sistemas remuneratórios para os agentes públicos, quais sejam: o tradicional, em que a remuneração compreende uma parte fixa e uma variável, e o novo, em que a retribuição corresponde ao subsídio, constituído por parcela única, excluindo a possibilidade de percepção de vantagens pecuniárias variáveis (DI PIETRO, 2006). Assim, em contraposição ao regime de vencimentos, o regime de subsídios se apresenta como importante instrumento de simplificação da forma de remuneração de carreiras públicas, não somente dos agentes políticos, em relação aos quais existe imposição da Constituição da República, por meio do art. 39, § 4°, mas também de outros agentes públicos.1 Em que pese ser incontroverso o fato de os agentes políticos municipais serem remunerados exclusivamente por subsídio, há questionamentos a respeito das formalidades que deverão ser observadas na fixação dessa remuneração, destacando-se, aqui: a) a necessidade de se aplicar ou não o princípio da anterioridade na fixação dos subsídios de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais, frente às modificações trazidas pelas Emendas Constitucionais n. 19/1998 e 25/2000 aos incisos V e VI do art. 29 e, b) a necessidade de se delimitar ou não a aplicação do princípio da anterioridade antes da data das eleições municipais. 1 Os agentes públicos remunerados por subsídios subdividem-se em: a) agentes públicos facultativamente remunerados por subsí- dios, dentre os quais, encontram-se os servidores públicos organizados em carreira, nos termos do art. 39, § 8°, da CR/88 e b) agentes públicos obrigatoriamente remunerados por subsídios, os quais, encontram-se os b.1) membros de Poder, detentores de mandato eletivo (os quais estão abrangidos pela expressão membros de Poder), Ministros de Estado e Secretários Estaduais e Municipais (art. 39, § 4°, da CR/88); b.2) membros do Ministério Público (art. 128, § 5°, I, c, da CR/88); b.3) integrantes da Advocacia Geral da União e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, Procuradores dos Estados e do Distrito Federal e Defen- sores Públicos (art. 135 da CR/88); b.4) Ministros e Conselheiros dos Tribunais de Contas (art. 73, § 3°, e art. 75 da CR/88) e b.5) servidores públicos policiais (art. 144, § 9°, da CR/88). 84
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII 4 Do princípio da anterioridade Como visto no segundo capítulo deste artigo, com o advento das Emendas Constitucionais n. 19/1998 e 25/2000, a Constituição da República passou a tratar expressamente da aplicação do princípio da anterioridade apenas na fixação da remuneração de vereadores (art. 29, VI, com redação dada pela EC n. 25/2000), tendo sido omissa, neste ponto, em relação à fixação da remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais (art. 29, V, com redação dada pela EC n. 19/1998). Já a Constituição do Estado de Minas Gerais de 1989 disciplina, no art. 179, caput, a incidência do mencionado princípio sobre a fixação da remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores, à semelhança do que dispunha o art. 29, V, da CR/88 antes de ser modificado pela EC n. 19/1998. Desse modo, diante do silêncio do art. 29, V, da CR/88, indaga-se se o princípio da anterioridade encontra-se adstrito à fixação da remuneração de vereadores. A doutrina pátria não é uníssona sobre a matéria. Santana (2004, p. 68-69) entende que, após a EC n. 19/1998, o princípio da anterioridade permaneceu como requisito para a fixação dos subsídios de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais, fundamentando seu entendimento nos princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade (contidos no art. 37, caput, da CR/88) e nos princípios da razoabilidade e da finalidade pública. O autor aduz, ainda, que o diploma normativo instituidor dos subsídios deverá ser votado antes das eleições municipais: Temos que a Constituição Federal não exige, expressamente, observância à anterioridade. Mas nos parece razoável que se cumpra tal exigência e tal ocorra antes de conhecidos os eleitos. Até mesmo para se efetivar os princípios da moralidade administrativa, impessoalidade e razoabilidade. Devemos reconhecer a normatividade dos princípios e a hegemonia normativa dos princípios em relação às regras. Na verdade, não se trata de teoria muito recente. No Brasil já houve decisões no STF que acolheram esse entendimento já em 1951. Apesar disso, jurisprudência e doutrina tradicional, de modo geral, ainda não admitem que seja aberta a possibilidade de fundamentação com base em princípios. Entendendo o princípio da razoabilidade, como o fez Agustin Gordillo, como uma das formas de expressão da legalidade; ou, como Recaséns Siches, que é o método próprio do direito, chegaremos à conclusão que propugnamos. Não significa que o princípio da anterioridade, após a EC n. 19/98, deixou de ser obrigatório, quando da fixação dos subsídios para Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais. Estamos convencidos de que o critério de fixação da remuneração na legislatura antecedente não foi banido da Lei Maior Federal — ainda que lá não esteja expressamente. Assim, é importante ressaltar que a anterioridade decorre não do comando suprimido pela EC n. 19 de 1998, mas dos princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade, contidos no artigo 37, caput, da Carta Política Federal, além de outros, como os da razoabilidade (princípio explícito em algumas constituições estaduais) e da finalidade pública. 85
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Significa dizer que o texto impõe às Câmaras a obrigatoriedade de a fixação dos subsídios ocorrer ao final de uma legislatura para vigorar na subsequente, porém, o ato fixador deve ser votado antes das eleições, quando ainda não se conhecem os eleitos, revestindo-se, assim, o ato, de imparcialidade. [...] (grifo nosso). No mesmo sentido, explica Marques (2010): [...] Do cotejo entre o texto anterior e a nova redação dada aos incisos V e IV do artigo 29 [da CR/88], poder-se-ia afirmar, com relação ao Prefeito e Vice-Prefeito, o abandono do princípio da anterioridade, [...]. Contudo, uma interpretação sistemática do texto constitucional distancia essa mera interpretação literal. Traz-se como fundamento os princípios elencados no caput do artigo 37 da nossa Carta Magna. Ora, os princípios da impessoalidade e da moralidade impõem a fixação da remuneração dos Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários antes do início dos seus mandatos. Contrariamente aos autores acima citados, Braz (2000, p. 33) leciona que “o subsídio do Prefeito Municipal é fixado, em qualquer época, em moeda corrente, por lei de iniciativa da Câmara Municipal (art. 29, V, da CF), observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4°, 150, I, 153, III e 153, § 2°, I, da Constituição Federal” (grifo nosso).2 O Manual Básico de Remuneração dos Agentes Políticos Municipais do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (2007, p. 12-13) orienta que a aplicação do princípio da anterioridade encontra-se restrita à fixação dos subsídios de vereadores, nos termos seguintes: [...] a Constituição estabelece anterioridade (de uma legislatura para outra) apenas para os Vereadores; caso assim quisesse para o Prefeito, Vice-Prefeito e Secretários Municipais teria o legislador assim expresso no sobredito inciso V. A justificativa recorrente para a anterioridade é a de que, se tal não ocorresse, estar-se-ia legislando em causa própria, com ofensa a pressupostos basilares da Administração, como os da moralidade, impessoalidade e transparência. No entanto, a fixação do subsídio do Prefeito e do Vice-Prefeito decorre de lei de iniciativa da Câmara Municipal; assim, referidos agentes não estabelecem seus próprios subsídios, vez que o processo se inicia no Legislativo, descabendo aqui a crítica de legislar-se em causa própria. Afinal, o respectivo projeto de lei depende da iniciativa e da aprovação do outro Poder estatal do Município. Informa-se que, dos posicionamentos acima aventados, o entendimento do TCEMG, consolidado no enunciado de Súmula n. 72, é pela obrigatoriedade de se observar o princípio da anterioridade na fixação dos subsídios não apenas de Vereadores, mas também de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Secretários Municipais. Conforme será visto adiante, as decisões da Corte de Contas Mineira baseiam-se numa interpretação sistemática do texto constitucional, notadamente, em relação ao caput do art. 37 da CR/88, o qual determina à Administração Pública observar, entre outros, o princípio da moralidade e o da impessoalidade. 2 Na mesma linha, Costa (2001, p. 70) aduz que a EC n. 19/1998 extinguiu a imposição da anterioridade da legislatura na fixação da remuneração dos agentes políticos municipais, “retornando apenas com referência aos Vereadores pela EC n. 25/00”. 86
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII 4.1 A data limite para a aplicação do princípio da anterioridade Partindo-se do pressuposto de que o princípio da anterioridade deverá ser aplicado na fixação dos subsídios dos agentes políticos municipais, surge um segundo questionamento atinente à subordinação ou não do referido princípio ao marco temporal correspondente à data das eleições municipais. A doutrina também não é pacífica sobre a questão. Castro (2006, p. 178) leciona que “o subsídio do Prefeito e do Vice-Prefeito deve ser fixado, isto é, estabelecido o seu quantum, como os mecanismos de sua apropriação e de reajuste, no final da legislatura e antes das eleições municipais, a despeito até mesmo de não ser exigida aqui a anterioridade” e elucida que: É inalterável, no curso da legislatura, o subsídio do Prefeito e do Vice-Prefeito. Não há como se lhes poder reduzir o subsídio sob pena de vulnerar, a um só tempo, os princípios do direito adquirido e da independência dos Poderes. Não se permite, não se autoriza se estabeleçam outros parâmetros senão os da legislatura, já fixados, estabelecidos, em que a Câmara Municipal, na matéria, chegou à exaustão, em toda a sua latitude, salvo a hipótese de reajuste que acompanha o princípio da remunerabilidade dos agentes políticos também (p. 180). Na mesma linha, posiciona-se Santana (2004, p. 85-87): Não tendo a Constituição Federal fixado data certa para a fixação dos subsídios e não constando da Lei Orgânica tal elemento, uma interpretação sistemática surge como necessária. O início da legislatura coincide com início do exercício do cargo de Vereador (que se dá juntamente com a posse). Na ordem lógica das coisas, o Vereador que toma posse já fora eleito e diplomado. Logo, as eleições já ocorreram, em outubro da legislatura anterior ao da vigência dos subsídios que vigorarão na legislatura subsequente. Pensamos que a fixação dos subsídios deve acontecer antes do pleito eleitoral (na legislatura anterior, mas até esse marco limite: antes de conhecidos os pleitos). Parece-nos que um ingrediente principiológico deve temperar o debate. Referimo-nos à impessoalidade e à moralidade. Se, após o conhecimento dos eleitos, a Câmara Municipal estiver cuidando do assunto subsídios e sua fixação, já se saberá quem serão os prováveis agentes políticos que tomarão assento no Governo (Legislativo e Executivo) na legislatura subsequente (para a qual os subsídios estão sendo fixados). Corre-se o risco, em tal circunstância, de se instituírem benefícios ou prejuízos, como o caso. Suponha-se a hipótese de reeleição (parlamentar ou não). O próprio edil estará (no caso dos subsídios parlamentares) fixando os seus próprios subsídios, em causa própria. É circunstância que, por inúmeros motivos, deve ser evitada. Noutro giro tem-se a fixação de subsídios (ainda na hipótese de já conhecidos os eleitos) daquele que foi o desafeto político no pleito que se encerrou. A precaução é óbvia. 87
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII Muito embora os mecanismos de controle estejam bem apurados, em termos formais, e embora o primeiro balizador constitucional (art. 29, VI) tenha face aparentemente aberta, propiciando situações análogas àquelas descritas, há outros limitadores na mesma Constituição Federal que sugerem que o fato (fixação dos subsídios) ecloda antes de conhecidos os eleitos. É a regra que tomamos como resultante da interpretação sistemática do disposto no artigo 29, VI, da CF, em conjugação dos princípios que determinam e fixam a moralidade, a probidade, a impessoalidade no trato da república (res + pública = coisa do povo). Mas apesar de não fixada (e concretizada) a anterioridade relativamente às eleições municipais, nada impede, porém, tal exigência nas constituições estaduais, dado o alcance do princípio federativo. Com opinião divergente dos autores acima citados, Ferraz (2009, p. 78-81) argumenta que os subsídios de vereadores poderão ser fixados até o final da legislatura anterior, ou seja, até o dia 31 de dezembro, considerando que o art. 29, VI, da CR/88 não restringe a aplicação do princípio da anterioridade a período precedente à data das eleições municipais: Não obstante a clareza do Texto Constitucional, que ao prescrever o princípio da anterioridade, se vale da expressão legislatura — deixando ver que até o final desta (31/12) seria possível fixar o subsídio dos edis —, o TCEMG firmou entendimento, com lastro nos princípios da moralidade e da razoabilidade, de que a fixação do subsídio deve se dar antes da realização das eleições municipais, evitando que o resultado destas influencie na aludida fixação (TCEMG — Consultas n. 624.801, Moura e Castro; n. 657.650, Eduardo Carone). [...] Logo, não se me afigura possível, data venia, que a Consulta do TCEMG, baseando-se em princípios constitucionais que não o da legalidade estrita, venha a estabelecer restrição maior do que a que estabelece o art. 29, VI, da Constituição: a fixação do subsídio dos edis poderá ocorrer até 31/12, termo final da legislatura anterior (grifo nosso). Sob a mesma ótica, Costa (2001, p. 69) assevera ser descabida a exigência de se fixar os subsídios dos agentes políticos municipais antes do conhecimento do resultado das eleições, pois o texto constitucional não faz previsão alguma nesse sentido: A fixação se impunha de uma legislatura para vigorar na subsequente, ou seja, poderia ser estabelecida do primeiro ao último ano de uma legislatura, estabelecendo a remuneração dos agentes políticos do mandato seguinte. Totalmente infundado afirmar que o estabelecimento da remuneração deve ser feito antes das eleições ou antes de conhecido o resultado das eleições, porque a tanto não obriga a norma constitucional, [...] (grifo nosso).3 Acrescenta-se que em decisão do STF, proferida no Recurso Extraordinário n. 62.594,4 consta, no voto do Ministro Relator Djaci Falcão, interessante transcrição do acórdão impugnado, no qual 3 Salienta-se que a opinião emitida pelo autor baseou-se na redação do art. 29, V, da CR/88 anterior à EC n. 19/1998. Como visto no primeiro capítulo deste estudo, antes da EC n. 19/1998, o referido dispositivo constitucional previa expressamente que a remuneração de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores seria fixada na legislatura anterior para vigorar na subsequente. 4 Recurso Extraordinário n. 62.594, Primeira Turma, Relator Ministro Djaci Falcão, julgamento em 21/08/1969. 88
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII se entendeu que, havendo previsão em lei de fixação de remuneração de membros do Poder Legislativo “em cada legislatura para a subsequente”, essa fixação deve necessariamente ocorrer antes das eleições para a renovação do Corpo Legislativo. Segue abaixo fragmento do voto: O acórdão impugnado, de que foi relator o ilustre Desembargador Rodrigues Alckimin, guarda a seguinte fundamentação: ‘[...] Quando a lei fala em fixação de remuneração, em cada legislatura, para a subsequente, necessariamente prevê que tal fixação se dê antes das eleições que renovem o corpo legislativo. Isso decorre, necessariamente, da ratio essendi do preceito. Vem ele na Constituição Federal (art. 47, § 2°), ao dispor que a ajuda de custo e o subsídio serão fixados no fim de cada legislatura. No fim de cada legislatura para a seguinte, afirmavam, de maneira mais completa, as Constituições de 1891, e de 1934. Pontes de Miranda, com acerto, pondera: “Agora, diz-se no fim de cada legislatura, em vez de no último ano de cada legislatura para a seguinte, o que é o mesmo” (Comentários à Constituição de 1946, v. 2°, pág. 251). E como observa Sampaio Dória, o escopo do dispositivo legal é o de evitar que os legisladores fixem, a si mesmos, remunerações (Comentários à Constituição de 1946, vol. II, p. 228). Ora, se essa fixação se desse depois das eleições para a Casa Legislativa, os legisladores estariam infringindo a finalidade do preceito, pois estariam, eventualmente, fixando os próprios subsídios, cientes, já, da permanência no corpo legislativo [...] (grifo nosso).’ No Recurso Extraordinário n. 213.524,5 o STF reconheceu estar em conformidade com a Constituição da República acórdão que declarou a insubsistência de ato de Câmara Municipal, formalizado após a data das eleições municipais, que reduziu o valor dos subsídios de vereadores. Para maior esclarecimento, seguem transcritos a ementa e excerto do voto do Ministro Relator Marco Aurélio: EMENTA: SUBSÍDIOS — VEREADORES. Longe fica de conflitar com a Carta da República acórdão em que assentada a insubsistência de ato da Câmara Municipal, formalizado após a divulgação dos resultados da eleição, no sentido de redução substancial dos subsídios dos vereadores, afastando o patamar de vinte e cinco por cento do que percebido por deputado estadual e instituindo quantia igual a quinze vezes o valor do salário mínimo. Voto do Ministro Relator: [...] A razão de ser de fixar-se ao término da legislatura em curso a nova remuneração está, justamente, em buscar-se a almejada equidistância, obstaculizando-se, assim, procedimento que implique legislar em causa própria ou em prejuízo daqueles de facção política contrária. Embora não haja previsão expressa no enunciado de Súmula n. 72 do TCEMG, as decisões da Corte de Contas defendem a necessidade de a fixação dos subsídios de Prefeitos, Vice- Prefeitos, Secretários Municipais e Vereadores ocorrer antes da data das eleições municipais, em observância aos princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade, o que será visto no capítulo posterior. 5 Recurso Extraordinário n. 213.524, Segunda Turma, Relator Ministro Marco Aurélio, julgamento em 19/10/1999. 89
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII 5 Decisões do TCEMG A questão atinente à aplicação do princípio da anterioridade sobre a fixação dos subsídios de agentes políticos municipais tem sido defendida em julgados do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, o qual consolidou esse entendimento no enunciado de Súmula n. 72. O mencionado verbete não faz qualquer distinção entre vereadores e os demais agentes políticos municipais, sendo relevante reiterar que a sua redação foi objeto de revisão na Sessão Plenária de 19/11/2008, data esta posterior às Emendas Constitucionais n. 19/98 e n. 25/2000. Em pesquisa às decisões do TCEMG, informa-se que, nas Consultas n. 774.643 (Cons. Rel. Adriene Andrade, sessão de 26/05/2010); 708.593 (Cons. Rel. Gilberto Diniz, sessão de 28/11/2007); 707.175 (Cons. Rel. Wanderley Ávila, sessão de 15/03/2006); 694.097 (Cons. Rel. Moura e Castro, sessão de 01/06/2005) e 693.891 (Cons. Rel. Moura e Castro, sessão de 09/03/2005), o Tribunal se posicionou favoravelmente à aplicação do princípio da anterioridade na fixação dos subsídios de agentes políticos municipais. Na Consulta n. 774.643 (sessão de 26/05/2010), a Corte manifestou-se, unanimemente, pela aplicação do princípio da anterioridade na fixação dos subsídios de Secretários Municipais, independentemente de previsão em Lei Orgânica Municipal. Segue transcrito fragmento do voto da Conselheira Relatora Adriene Andrade: A observância do princípio da anterioridade na fixação dos subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais foi pacificada neste Tribunal com o entendimento de que é vedado o aumento dos subsídios desses agentes políticos para vigorar na mesma legislatura em que ocorreu a alteração, permitida apenas a recomposição da perda do valor aquisitivo da moeda, nos termos da Súmula n. 73 desta Corte. Assim sendo, a fixação dos subsídios de Secretários Municipais está sujeita ao princípio da anterioridade, por força dos princípios da moralidade e da impessoalidade estabelecidos no caput do art. 37 da CR/88, independentemente de sua previsão na Lei Orgânica do Município. Posteriormente, na mesma consulta, a Conselheira Relatora ressaltou que a aplicação do princípio da anterioridade restringe-se à fixação da remuneração dos agentes políticos municipais, não se estendendo ao sistema remuneratório dos servidores municipais: [...] o princípio da anterioridade é de observância obrigatória apenas para os agentes políticos, que, em decorrência dos princípios da moralidade e da impessoalidade, ficam impedidos de participar da fixação de seus próprios subsídios. O sistema remuneratório dos servidores públicos, por seu turno, é definido no plano de cargos e salários do Órgão Público, não sendo alcançado pelo princípio da anterioridade. Note-se que, segundo entendimento adotado por este Tribunal nos autos da Consulta n. 811.245, de minha relatoria, submetida ao Pleno em 24/02/2010, 90
Doutrina revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII agentes políticos, no âmbito do Município, são apenas o Prefeito, o Vice- Prefeito, os Secretários e os Vereadores. Pelo exposto, tem-se que a fixação dos vencimentos de Diretor de Departamento Municipal não se sujeita ao princípio da anterioridade, porque os cargos em comissão estão subordinados às regras do plano de cargos e salários do Órgão Público. Já na Consulta n. 707.175 (sessão de 15/03/2006), o Conselheiro Relator Wanderley Ávila ressaltou que os subsídios de Secretários Municipais não poderão ser alterados no curso da legislatura, ainda que ocorra modificação na carga horária relativa àquele cargo, nos termos seguintes: No mérito, manifestando-me em tese, respondo também negativamente à questão formulada pelo Presidente da edilidade, quanto à alteração dos subsídios dos Secretários na mesma legislatura. Reitero o entendimento deste egrégio Tribunal e da jurisprudência dominante nos outros tribunais, quanto à impossibilidade de alteração, na mesma legislatura, do subsídio dos Secretários Municipais, em princípio, em qualquer hipótese, ainda que tenha por escopo acompanhar a alteração — aumento ou redução — da carga horária relativa ao cargo. [...] [...] como já dito, a fixação e alteração da jornada de trabalho dos Secretários Municipais constituem matéria de competência do Município, no exercício de sua autonomia administrativa. Porém, é importante destacar que qualquer alteração na jornada de trabalho do Secretário Municipal que ocorra no curso da legislatura não poderá implicar na redução ou aumento do seu subsídio. Reitero que a norma que implicar fixação e alteração do subsídio do Secretário Municipal somente poderá vigorar para a legislatura subsequente àquela em que foi fixada ou modificada. Na Consulta n. 693.891 (sessão de 09/03/2005), o Conselheiro Relator Moura e Castro deixou claro que o princípio da anterioridade permaneceu como requisito obrigatório para a fixação da remuneração de agentes políticos municipais após o advento da EC n. 19/1998: [...] a anterioridade da fixação dos subsídios desses agentes políticos [Prefeitos, Vice-Prefeitos, Vereadores e Secretários Municipais] decorre não do comando suprimido pela EC n. 19/98, mas dos princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade, contidos no art. 37, caput, da Carta Política Federal, além de outros, como os da razoabilidade (art. 13 da Constituição Mineira) e da finalidade pública. Todavia não devemos confundir inalterabilidade com reajustamento, pois o escopo deste é o de preservar o valor aquisitivo dos subsídios, já o daquela é o de impedir a mutabilidade ou alteração da remuneração para vigorar na mesma legislatura. Logo, é legal e constitucional o reajustamento dos subsídios dos agentes políticos municipais, cuja disciplina se encontra normatizada no parágrafo único do art. 179 da Constituição Mineira de 1989. Salienta-se que, nos julgados acima mencionados, o TCEMG ressalva a possibilidade de recomposição dos subsídios de agentes políticos municipais no curso da legislatura, nos termos 91
También puede leer